terça-feira, 2 de setembro de 2014

Os milhões do pontapé na bola, a obscenidade dolorosa

Do prazer ao rancor, assim posso sintetizar a evolução dos meus sentimentos em relação ao futebol.
Há que hierarquizar os acontecimentos da vida colectiva. Nos actuais tempos de crise em que as sociedades europeias estão mergulhadas, com milhões de cidadãos punidos pela pobreza e mesmo a miséria, obsceno é o menor dos desqualificativos apropriado para etiquetar o negócio do futebol actual.
Mesmo incluindo a Alemanha, expressão do domínio económico do Velho Continente, na União Europeia (28 países) sobrevivem 24.850 milhões de desempregados e na Zona Euro (18 países) o desemprego, a uma taxa de 11,5% em Julho 2014, atingiu 18.409 de cidadãos de ambos sexos.
O desemprego juvenil é naturalmente elevadíssimo: 5.062 milhões de jovens é a estimativa; sublinho estimativa, porque aos cálculos do Eurostat partem de critérios, os quais Portugal também aplica, e conforme o ‘Expresso’ demonstra à exaustão, na edição do último Sábado, menorizam ardilosamente a dimensão real deste desastre social.
É neste cenário de falta de trabalho, de remunerações ao nível da escravatura dos tempos modernos, de crescente número de famílias na pobreza e miséria, que os milhões e milhões de libras ou euros aplicados na transacção de jogadores de futebol me agitam a alma. A revolta é impulsionada por essa gentalha triunfadora da desgraça e da falta de tino alheias, pertençam à mafia russa, às oligarquias árabes ou grupos privilegiados – um exemplo destes últimos é constituído pelos dirigentes do Real Madrid e Barcelona, com gastos de 161 milhões de euros em dois jogadores, Suarez e James Rodriguez, ambos colombianos. Todavia, a taxa de desemprego em Espanha era de 25,2% em Julho passado, a segunda maior dos 28 países da UE depois da Grécia com 27,2%.
Nas terras de sua majestade, que poderão ficar amputadas da Escócia, apenas um clube, Manchester United, investiu 188 milhões de euros. Em Portugal, confinado à sua pequenez, através dos 3 grandes também se transaccionou, na compra e venda, diversos jogadores, na casa de alguns milhões. Mais de 20, estou certo.
Esta sociedade do futebol e de outras ignomínias, a mim, aqui neste interior de Portugal de velhos e pobres, causa-me indignação, mas igualmente sofrimento. A Comunicação Social, SIC Notícias e TVI 24 em especial, com vastos tempos de antena dados ao futebol, pela voz de alguns impreparados que praticam uma espécie de AO falado, suscitam-me repugnância.
O retorno de Judite de Sousa, cuja dor da perda de um filho respeito, parece-me não ter sido a mais recomendável, ao escolher o CR7 para a entrevista de regresso.
Outras figuras portuguesas, bem menos propaladas e de elevado prestígio no mundo científico, mereceriam a preferência desse destaque – a Prof.ª Elvira Fortunato ou o Prof. Sobrinho Simões ou a Prof.ª Maria do Carmo Fonseca ou qualquer outro dos muitos investigadores, mulheres e homens da ciência. Compreendo e refuto a razão por que foram preteridos: não pertencem ao abominável mundo da ‘imprensa cor-de-rosa’.

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